A volta da era das incertezas

Há pouco mais de 30 anos, o historiador F. Fukuyama, num ensaio polêmico, sugeriu que a “democracia liberal” seria a forma final de governo após o colapso do comunismo. O mundo seguiria daquele ponto em diante numa mesmice política a ser paulatinamente aperfeiçoada, uma vez que nada mais haveria a se produzir de inédito, com concentração de problemas no mundo econômico e seus derivativos, crescimento, produção e produtividade, empregos e salários, poder de compra, terceirização e globalização, inflação, urbanização, petróleo, dívida de países e assim ia.

Fukuyama sabia que a Terra tinha aproximadamente 5 bilhões de anos, que já houvera pelo menos cinco extinções massivas da vida. Hoje, se estima que existam apenas 10% dos animais que já andaram por ela. Ele ainda era conhecedor do sistema político de freios e contrapesos idealizado por Montesquieu e as ideias humanistas de homens como Voltaire, Diderot, Hobbes, que tinham pouco mais de 200 anos. Elas romperam com privilégios, com ditaduras e monarquias absolutas, trazendo à luz a democracia alçada à categoria de certeza de forma política, como sucintamente dito por Churchill: “A democracia é a pior forma de governo, exceto todas as outras que foram tentadas.”

Mas o dito popular “o mundo não gira, o mundo capota” se escancara pleno no momento, e todos os problemas que achávamos que tínhamos há pouco tempo se tornaram questões menores ultimamente. Vejamos:

Neste ano, 4,2 bilhões de pessoas participaram de eleições, que em tese deveriam ser democráticas e livres – em tese. As democracias – seja por suas imperfeições de representação, proporcionalidade, forma de contagem e atribuição de votos, seja pela forma de aparência, pelas ditaduras disfarçadas, pelos candidatos impostos e fantoches déspotas eleitos – não tem dado as respostas à ansiedade política dos cidadãos. No grande palco virtuoso da democracia da era moderna, os Estados Unidos, cujos cidadãos não querem ou não gostariam de votar, viverão eleições disputadas por dois candidatos octogenários. Vários países de ultradireita, avessos aos ideais democráticos – com tribunais e imprensa livres e independentes, possibilidade de acordos com os diferentes – têm conquistado espaço. E, por absurdo que pareça, querem acabar e reduzir direitos de seus cidadãos, que de tão idiotas estão achando isso bom, impondo potenciais ditadores na política, que fazem o pior da democracia traduzindo-a por uma “ineptocracia”.

E do problema político se vai ao climático, cuja urgência vem cobrando posturas reais. Efeitos do aquecimento global já são sentidos mesmo pelos mais entusiastas negacionistas e demandam uma colaboração planetária que jamais aconteceu. Temos alguns países mais falando de que fazendo, como o marqueteiro Estados Unidos, ou países ótimos no discurso, com medidas mais efetivas, como na China. No entanto, o problema urge de mais atitudes, na medida em que todos sentem as questões climáticas mais extremadas e distintas do que foram há pouco mais de 30, 40 anos.

Como se tudo isso não bastasse, a nuvem tecnológica da inteligência artificial, que paira sobre tudo e a tudo ataca, é onde se estabelecerão os novos e mais eficazes padrões de produção, produtividade e criação de riqueza. O resultado pode ser um novo fosso, uma verdadeira clivagem, que poderá se tornar abissal entre nações que dispõem de tecnologia e serão seus formuladores, e nações que não a têm ou dominam. Acrescido a todo o falado, o uso inadequado desta ferramenta chamada inteligência artificial.

O planeta exige uma nova era às nossas incapacidades de respostas, tudo a criar mais incertezas.

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