Adiamento do julgamento do Atlético Mineiro aponta como a homofobia ainda é tratada no futebol brasileiro

Em matéria para o Jornal Jurid, Nilton Serson fala sobre a situação dos clubes, que  devem se engajar mais na promoção da inclusão LGBT e na conscientização de seus torcedores para eliminar o preconceito. Ele acrescenta que, apesar de ainda não ter ocorrido um incidente grave, a pressão da torcida e de outros atletas cria um ambiente hostil para atletas LGBT. Além disso, campanhas contra esse comportamento foram lançadas, mas não de forma eficaz, e alguns dirigentes perpetuam o preconceito em suas declarações.

Confira a matéria na íntegra no texto abaixo ou no link.

 

 

 

 

Adiamento do julgamento do Atlético Mineiro aponta como a homofobia ainda é tratada no futebol brasileiro

No dia 03 de fevereiro, em partida válida pela primeira fase do Campeonato Mineiro, o clássico entre Atlético Mineiro e Cruzeiro, ocorrido na Arena MRV, do clube alvinegro, fez com que torcedores, jogadores e outros envolvidos no evento presenciassem parte dos adeptos do mandante reproduzirem gritos homofóbicos ao goleiro rival, Rafael Cabral.

 

A ratificação de que isso estava acontecendo desde o início do jogo veio do próprio árbitro, ao relatar o ocorrido na súmula. Com esse posicionamento do juiz da partida, o caso pôde ser levado ao TJD-MG (Tribunal de Justiça Desportiva de Minas Gerais), que denunciou o clube pelas ações da torcida.

 

Com julgamento marcado para o dia 27 do mesmo mês, as penas poderiam variar, entre compensação financeira e até a punição mais forte prevista no regulamento da competição, sendo a exclusão do campeonato, o que seria a mais forte punição a um dos principais times do país ocasionados por homofobia. Vale lembrar que o Grêmio passou pelo mesmo, pela Copa do Brasil, mas o crime era o de racismo.

 

Entretanto, o que poderia ser um marco desde que a justiça desportiva passou a encarar o problema de forma mais dura, acabou em adiamento do processo, por novas evidências apresentadas pela defesa, fazendo com que o clube se mantenha ativo e firme na competição, onde busca o pentacampeonato consecutivo.

 

Na visão de Nilton Serson, advogado defensor da causa LGBT, “Não adianta querer fazer regras e regulamentos se eles não forem cumpridos. Aos olhos da lei, no caso, a desportiva, há punição para quem praticar o ato de homofobia em estádios de futebol. Quem paga pela irresponsabilidade da torcida é o clube, podendo ter penas brandas ou rígidas. Entretanto, com essa tática de adiamento, sem nova data para a resolução do caso, a sensação que fica é a de impunidade certeira. Algum tempo antes, o Corinthians, em São Paulo, sofreu uma punição por essa prática, mas não foi tão dura quanto deveria ser para acabar com esse comportamento. Agora, com a decisão do TJD-MG, parece que o mundo do futebol voltou à estaca zero”.

 

Como apontou Serson, o Corinthians foi um dos clubes que teve sua torcida entoando gritos homofóbicos, em clássico contra o São Paulo, mas, desde então, pouca foi a evolução das punições sobre o assunto.

 

Uma das práticas utilizadas pelas torcidas é gritar “bicha” quando o goleiro adversário for cobrar um tiro de meta. Uma das maiores vítimas desses ataques foi o goleiro Rogério Ceni, sendo alvo de rivais e adversários de menor porte.

 

A popularização desse grito veio dos torcedores mexicanos, ao fazerem o mesmo, mas com palavra específica do país, quando os adversários da seleção colocavam a bola em jogo. No caso dos torcedores da La Tri, como é chamada a seleção local, a FIFA (Federação Internacional de Futebol Associado) puniu a equipe e a federação com dois jogos sem torcida e multa de, aproximadamente, R$330 mil na época. Mesmo assim, a prática ficou famosa.

 

“É preciso que os clubes façam mais pela comunidade LGBT e conscientizem seus torcedores a extinguirem esse tipo de comportamento. Ainda não houve um acidente muito grave envolvendo esse assunto, como outros preconceitos também escapam por enquanto, mas, quando um esporte não permite que os atletas sejam gays ou mesmo bissexuais, por conta da pressão da torcida e de outros atletas, tudo passa a ser uma questão de tempo. Até existem campanhas feitas pelos clubes buscando o fim desse comportamento, mas elas ainda não surtiram o efeito esperado. Inclusive, alguns dirigentes fazem essa ideia permanecer viva, ao repetirem as mesmas falas preconceituosas”, complementa Serson.

 

Para o advogado, os clubes precisam pegar ainda mais pesado com os preconceituosos, visto que são eles que são punidos em eventual reincidência, além de muitos clubes terem atualmente, torcidas LGBT.

 

“Quando a Coligay foi criada no Grêmio, permitiram sua permanência por ser ‘pé quente’, mas, na primeira chance, foram expulsos do estádio. Quando o Flamengo teve a sua, torcedores, diretores e mídia a culparam pela má fase dentro de campo, ao invés de procurar o verdadeiro problema. Quando o Corinthians precisou sair da fila, em 1977, chamou a mesma Coligay, do Grêmio. No fim, além da consciência para mudar o pensamento do torcedor, é preciso acabar com a hipocrisia existente no mundo do futebol”, explicou o advogado.

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