O Liberalismo como Valor para a Comunidade LGBTQI+

Desde sua origem, o liberalismo tem sido o alicerce para a construção de uma sociedade igualitária, justa e feliz.

Surgido como resultado da Revolução Francesa, o Liberalismo trouxe consigo a busca por valores como igualdade, liberdade e solidariedade. Anteriormente, apenas a elite do comando das monarquias e impérios desfrutava de privilégios, mas com o advento do Liberalismo, teorias se tornaram práticas. O estado de direito foi instituído, permitindo à sociedade produzir um direito comum, respeitar suas próprias leis e aplicá-las a todos, independentemente de sua condição social. 

A Revolução Industrial acompanhou essa nova perspectiva de liberdade, levando ao progresso material e pessoal sem precedentes. Fortunas burguesas foram criadas, cidades e megalópoles surgiram, serviços foram estabelecidos, a produção em escala foi implementada, assim como os métodos tayloristas de produção. Essa revolução econômica completa marcou a transição da sociedade feudal para um mundo industrial. A difusão do conhecimento e da tecnologia tornou-se essencial para atender às demandas de uma sociedade ávida por bens e com necessidades de saúde tanto privadas quanto públicas. 

Nesse contexto de transformações, também floresceu a ideia romântica do amor. Embora o amor sempre tenha existido, as relações anteriormente eram guiadas por interesses sociais, políticos e econômicos, em vez de escolhas pessoais e afetivas. A construção do amor passou a orientar as relações pessoais, sendo uma das experiências mais gratificantes e desafiadoras da vida. Por outro lado, ficou evidente que a ausência do amor, a carência afetiva e o vazio levavam a humanidade à loucura, à violência e à dor. 

Contudo, nem tudo foi perfeito. O individualismo exacerbado resultou em condutas egoístas prejudiciais à sociedade, o que gerou reações e questionamentos sobre os meios de produção, a riqueza individual e a falta de preocupação com o outro. A necessidade de considerar todos os estratos sociais, especialmente os menos favorecidos, trouxe o tema da solidariedade para o centro do debate político. Surgiram a esquerda, os sindicatos, o socialismo e o comunismo como ideais que visavam equilibrar a liberdade, os métodos e as formas de produção para beneficiar a sociedade. No entanto, esses ideais foram distorcidos e resultaram em ditaduras horrendas, onde a liberdade individual sequer era permitida. 

Deng Xiaoping, líder pragmático da China nos anos 70, percebeu que o comunismo estava levando seu país a uma estagnação ineficiente e corrupta semelhante à União Soviética. Ele aboliu o dogmatismo comunista e liberou a produção e a propriedade individual, resultando em uma exuberância econômica perceptível para quem visita o país. Assim, o conceito de propriedade coletiva comunista praticamente desapareceu do mundo, juntamente com a produção coletiva para suprir as necessidades da sociedade, algo que o comunismo nunca havia alcançado. 

Embora os conceitos de esquerda não devam ser negligenciados, é necessário abordá-los com mais parcimônia. Nos anos 80, o então primeiro-ministro do Reino Unido, Tony Blair, cunhou o termo “terceira via social” para descrever sociedades que defendem a livre iniciativa, a propriedade privada e o individualismo, sem desconsiderar os menos privilegiados, com ênfase na igualdade de oportunidades. Essa abordagem também tem sido adotada nos Estados Unidos desde sua fundação, com base nas ideias de John Rawls, buscando o bem-estar social e se preocupando com áreas como educação, segurança, aposentadoria, habitação e saneamento básico, em benefício do coletivo, e não apenas do indivíduo. 

Todas as ideias mencionadas até agora foram incorporadas à nossa Constituição Federal de 1988, que, queiramos ou não, estabelece o tom das nossas relações pessoais e sociais. É importante fazer uma distinção entre direito e moral: enquanto o direito é aplicável a todos, sem exceção, a moral é individual. Para que a sociedade alcance seus objetivos, ela precisa se basear em direitos que se apliquem a todos. Assim, se alguém quer ser budista ou metodista, para o Estado tanto faz, desde que essa pessoa cumpra as leis que se aplicam a todos. 

Dito isso, chego ao cerne deste artigo: por que a grande maioria dos políticos que defendem as bandeiras LGBTQI+ são de esquerda? Por que os liberais não adotam em seus planos de governo a agenda LGBTQI+? Mesmo com todo o arcabouço jurídico que garante igualdade de condições para gays e heterossexuais, ainda há uma baixa representação política liberal entre a comunidade LGBTQI+. Na última Parada Gay de São Paulo, que foi motivo de orgulho e celebração, vimos milhões de gays e seus simpatizantes nas ruas. Por que não vemos políticos se associarem a essa parcela significativa da população? O que falta a eles? Será que há preconceito internalizado? Homofobia? 

Como um homem gay que adota ideias liberais, sinto que não sou representado pelo PSOL, que se baseia em ideias comunistas e socialistas ultrapassadas. Para mim, essas ideologias têm apenas relevância histórica e cultural. Pior ainda, certas ideias coletivistas defendidas por esse partido podem sobrepujar escolhas pessoais e comportamentais, algo com o qual não concordo, obviamente. 

Acredito que todo gay deveria abraçar o liberalismo por sua essência, pois o liberal busca a felicidade pessoal para o maior número possível de pessoas, visando atingir o ápice da paz social. Embora eu possa discordar, por exemplo, da prática do aborto, compreendo que essa questão afetará apenas aqueles que voluntariamente optarem por abortar. Portanto, isso não me diz respeito, e sou a favor dessa prática, pois entendo que é melhor para toda a sociedade. Isso é o que Isaiah Berlin chamou de liberalismo passivo. Todos devemos apoiar o casamento gay seguindo a mesma linha de raciocínio. O liberalismo pressupõe que, se todos fizerem o que desejam, desde que não afetem os outros, a sociedade alcançará um estado de felicidade. Obviamente, estou me referindo a afetação real, não a padrões dogmáticos religiosos. Vale ressaltar que o Direito é laico, e eu acredito firmemente nisso. 

Em conclusão, o liberalismo tem muito a oferecer à comunidade LGBTQI+. Ao adotar os valores de igualdade, liberdade e solidariedade, podemos construir uma sociedade mais inclusiva, onde todos os indivíduos, independentemente de sua orientação sexual, possam desfrutar de plenos direitos e felicidade. É hora de romper com estereótipos políticos e criar um espaço para o liberalismo abraçar a agenda LGBTQI+ de forma efetiva e comprometida.

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